Agronegócios

Entenda o que muda com a aprovação da recuperação judicial para produtores rurais

Foto: Canal Rural

– Garantia de direito à recuperação judicial para produtor rural pessoa física

No campo jurídico, já havia reconhecimento de que o produtor rural pessoa física, que exerce a atividade há pelo menos dois anos, tem direito de pedir a recuperação judicial. Na visão de advogados, incluir estes termos na Lei Geral de Falências fixa a garantia de direito obtida em tribunal superior.

Em novembro de 2018, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que as dívidas contraídas pelo produtor rural José Pupin, antes da inscrição dele na Junta Comercial – quando ainda era pessoa física – poderiam entrar nos cálculos de dividendos para processo de recuperação judicial.

– Documentos que comprovam atividade rural

O texto do projeto de lei define quais documentos precisam ser disponibilizados pelo produtor rural pessoa física a fim de se obter o direito de solicitar a recuperação judicial. Para comprovar o desempenho de atividades rurais há pelos menos dois anos, o agricultor ou pecuarista precisará apresentar o livro caixa digital ou a obrigação de registros contábeis, além da declaração de ajuste anual do imposto sobre a renda e o balanço patrimonial.

Como a maior parte dos produtores pessoa física não costuma elaborar balanços patrimoniais, é preciso se atentar à necessidade de possuir este documento. Produtores, que quiserem se precaver, devem incorporar o balanço patrimonial à rotina de contabilidade do negócio.

– Dívidas que podem ser incluídas na RJ

O projeto de lei aprovado permite a inclusão apenas de créditos ligados exclusivamente à atividade rural, com comprovação em registros e não-vencidos. Dívidas do crédito rural que não tenham sido objeto de renegociação entre o devedor e a instituição financeira antes do pedido de recuperação judicial poderão ser incluídas no processo.

As Cédulas de Produto Rural (CPRs) financeiras também estarão sujeitas à negociação. São estas as cédulas nas quais o produtor recebe dinheiro em espécie de uma trading, por exemplo, para financiamento da safra, com a garantia de que pagará o financiamento também em dinheiro ao final da operação.

– Dívidas que não podem ser incluídas na RJ

Dívidas de créditos oficiais obtidos à juros controlados por subsídios estarão excluídos. O entendimento de Casa Civil e Ministério da Economia é de que incluir créditos que utilizam recursos do Tesouro Nacional seria fornecer um duplo benefício ao solicitante. Dívidas ligadas à compras de propriedades rurais realizadas em até três anos antes da solicitação da RJ também estarão excluídas da negociação.

As CPRs físicas, via de regra, não poderão ser incluídas na RJ. Sejam àquelas negociadas com antecipação parcial ou total do preço e com operações barter. A exceção ficará por conta de “casos fortuitos ou de força maior” a serem definidos pelo Ministério da Agricultura.

Este último item gera debate entre produtores rurais. Além das CPRs físicas serem contratadas em maior escala do que as financeiras, no entendimento de especialistas, essa exclusão consolida a falta de isonomia existente na relação comercial entre produtores e tradings. Produtores que tenham negociado pagamentos de cédulas em sacas de soja, por exemplo, não poderão incluir esta operação na recuperação judicial, o que protege credores como tradings. Porém, quando tradings solicitam a recuperação judicial, as dívidas contraídas com produtores rurais são incluídas na negociação.

– Direito à recuperação judicial em regime especial

Produtores rurais que tenham dívidas totais de até R$4,8 milhões poderão apresentar plano especial de recuperação judicial. No plano especial, a dívida poderá ser diluída em até 36 parcelamentos mensais corrigidas pela taxa Selic. O pagamento da primeira parcela deve ocorrer em até 180 dias após o pedido de RJ. Neste regime, o processo é mais ágil já que não há a exigência de que uma assembleia de credores aprove o plano de recuperação.

Para a Aprosoja Brasil, o teto estipulado é baixo e deve abranger poucos produtores rurais. A entidade sugeria a alteração da cifra limite para R$10 milhões. O senador Randolfe Rodrigues (REDE-AL) chegou a protocolar uma emenda no Senado que aumentaria o teto para R$7 milhões, mas pelo valor inicial ter sido objeto de acordo entre poderes Executivo e Legislativo, o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AL), relator da matéria, optou pela rejeição da emenda.

Em nota oficial, a Aprosoja ainda avaliou que “uma série de ajustes se fazem necessários via novo projeto de lei” para garantir melhor acesso do produtor rural à recuperação judicial. A associação cita a necessidade dos pagamentos negociados serem anuais ao invés de mensais, se ajustando ao regime de safras, “e melhor definição do tratamento dado às dívidas provenientes do crédito rural, para evitar o que se tem hoje, que são as instituições financeiras se utilizando de hermenêutica jurídica para negar-se a aplicar as políticas públicas voltadas a mitigar os efeitos do endividamento”.